13 de novembro de 2010

O Magusto de Marmelete - 2010

Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
Os magustos c'meçam inda a famila nã chigô toda...


A gente aqui tem-se p'r c'stume fazer os magustos no pr'mêro de Novembro, Dia de Todos Santos. Nã sê que jêto, nas ôtras terras todas p'r'í' fora, só dia de S. Martinho é que s' alembram de fazer tal coisa. Calhando, é premode eles acompanharem as castanhas com aquela bobida, munto deslavada, que tem memo o nome com ela: água-pé.

Más o qu' eles nã sabem é que com uma castanhita assada calha bem é um calcesinho de madronho, nã é aquilo. Inda p'r cima, num tempo destes, que já faz um belo frio, ir bober água-pé, uma coisa que nem dá p'a um homem aquecer... Isto p'a nã falar im coisa pior ainda... É que se calha a barriga duma pessoa a nã acêtar bem aquela morraça, um f'lano inda s' afitura a l'e dar, com l'cença da palavra, alguma borrêra...

Uma ocasião, isso dé-se aí com um amigo, munto graganêro, que foi a casa dum parente dum compadre dele e, pro jêto, tinham lá um barril de vinho, inda fêto de pôco tempo, por incetar. Ora, o ôtro, nã sê se já por judêria ó nã sabendo bem o que fazia, foi abrir essa tal vasilha e infiô-l'e p'a lá com umas copadas valentes.

Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
Em o vento pertando, é uma zorrêra que nã se vê quái nada...


O vizinho Manel Mansinho - nã queria alomear o nome, mái agora já disse, pacência... - munto graganêro c'm' ê cá já disse, nã negô carga. Ora, nã é qu' ê cá quêra d'zer qu' ele vêo de lá munto escorvado, qu' o homem des que àguenta munta bobida, mái, inda vinham a mê caminho de volta, t'veram logo qu' aparar o carro, lá num certo sito, p'a ele se governar. E, tã penas chigô a casa, aquilo era de tornêrinha... Mái, nã cudem, andô quái perto duma semana de sôltura...

E quem me contô isso tudo foi méme a m'lher dele, a ti Zabel Carrusca, passados pôcos dias do caso se dar. A m'lher - dizem... qu' ê cá nã me meto nisso... - é malina do pior, inda 'tava toda infèzada com aquilo, descosé-se a contar tudo, qu' ela nã gosta nada qu' ele beba. Máicudem que me contô só a mim. Foi a mim e a quem quis ôvir.

De manêras que, nã hôve bicho-careto que nã t'vesse sabido qu' o ti Manel Mansinho andô dia e nôte de calças na mão... Ele até f'cô aí im moda uma quadra já munto antiga qu' o Adelino da Desmoitada, munto gozão, l'e recitô da primêra vez qu' o viu na Vila, em dia de Domingo, a seguir a isso.

Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
A mêo da tarde, ele há magustos p'r toda a banda...


Agora, em vendo o ti Manel, vem-me logo à mimóira essa dita quadra, que nã sê quem é qu' a enventô:


End'rêta-te, Zézinho
sustém-te, ó Micaela
nunca mái se bebe vinho
'té curar esta piela


Mái, uma ocasião, d'zeram isso ô pé da ti Zabel. Punhana!... Dé-l'e um géno tã grande ó tã pequeno, inxovalhô todos q'ontos ali 'tavam duma tal manêra que f'cô tudo caladinho que nem ratos... Nenhum abriu mái pio...

A m'lher, sigundo corre fama, na frente dos ôtros nunca bebe, mái lá na casa dela, sozinha, inda bem não, baldêa umas copadinhas sem ninguém ver. Más isso é lá com ela. Se ser verdade, désna que nã se meta com a vida alhêa, que l'e faça bom prevêto...

Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
Quem tenha munta prática faz um magusto de tod' ô tamanho...


Mái, premode esta conversa, já quái que me desquecia de falar do magusto de Marmelete. Aquilo, 'tá bom de ver, é, todos anos, mái ó menes a méma coisa. E inda bem. Se é um magusto, é um magusto... E um magusto, aqui na nossa zona, é assar castanhas, come-las, bober uns calcesinhos dela, charolar e tisnar a cara dos ôtros...

Agora, e fazem muntíssimo de bem, tamém assam um pórco, põem umas barrecas com bolos e f'lhozes, vendem cerveja im vez de madronho e até usa a lá 'tar o jogo do bicho com um porcalho da índia a escolher qual é o que ganha a garrafa do vinho porto.

Isto p'a nã falar do palco adonde parêcem a tocar e cantar uns qu' ê cá nã nos conheço de banda nenhuma, mái tenho a firme certeza qu' hô-de ser malta do melhor que há. P'r menes, a minha comadre C'stóida, nã sê s' é verdade s' é mintira, des que 'tava a d'zer à prima Jôquinita, a mulher do Tóino Arraúl, que já os tem ôvisto na Rádio Fóia:

Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
À fim dum pôcachinho, olha-se p'a debaxo do fogo e já têm aira de 'tarem assadas...


- Sa senhora, prima. Inda ontontem, 'tava ê cá ôvindo a Rádio Fóia, já nã m' alembra bem é se era a senhora Fátima Peres da Rota do Sol, se era a senhora Idalete Marques do Expresso da Tarde... Ó, atão, saria os Discos Pedidos da senhora Telma Santos?... Olhe, a minha cabeça já nã 'tá capaz... Mái foi na Rádio Fóia quái de certeza. Atã ê cá nã oiço mái nenhuma a nã ser a Rádio Fóia...

- E 'tava lá algum destes a tocar?

- A tocar e a cantar!... Atã, nã tem ôvisto falar qu' aquele àlém é, béque-me, organista-vocalista?!...

- !... Organista-vocalista... E o qu' é qu' é isso?

- Ê cá nã sê... Mái nã tem nada im ser aquele aparelho qu' ele tem àlém... que faz tudo...

- Atã isso, trazê-los aqui, há-de f'car puxado p' à Junta...

- Isso sabe-se!... Ora, puxado... Há-de custar o coiro e o cabelo...

- E vá lá qu' ele desquecé-se trazer aquelas moças que usam a andar ali, quái im pelote, abanar o rabo im cimba do palco. Bem fêta qu' é p' ô estapôr mê Antóino nã vir semp'e p' aqui, fêto parvo, a olhar p'a elas, todo baboso...

- Ó prima Jôquinita, isso nã é só o sê Antóino... Eles sã todos iguales. Atã cuda qu' o mê Jôquim e além o Parente da Refóias nã fazem o mémo?!... Olhe p'ra eles, além im baxo, os três, com o olhos fitos naquelas moças....

- Ah, marafados! E lá vão eles tisná-las!... Dêxa qu' ê, mái logo, logo l'e digo ô meu... Ele que venha cá munto p' ô mê lado, todo meloso, c'm' q'ondo quer certas coisas, que logo vê...

 Magusto de Marmelete - 1 de Novembro de 2010
Mal uma pessoa nã s' aprecata, leva logo uma tisnadela...


Mái, inda com respêto ô magusto de Marmelete, semp'e l'es digo que quem nunca cá vêo nã viu o qu' era bom. É qu' isto nã é um magusto, sã dúizas de magustos. Cada qual faz o seu, querendo. Nã querendo, come das castanhas qu' os ôtros assam. E tudo de graça, nã cudem... As castanhas...

Agora bobida, isso, quem querer molhar o bico, ó traz uma garrafinha de casa c'm' ê cá faço sempre e más os mês amigos, ó, atão, tem que a ir comprar lá às tales barrecas. Mái pode ir à confiança qu' aquilo nã é caro e o material é de pr'mêra.

E, assim sendo, mês belos amigos, pr' ô ano, na façam a falseta. Os que já vieram, venham ôtra vez. Os qu' inda nunca cá parceram, parêçam que nã dã o tempo p'r mal impregue.

Querendem ver videos e retratos do que se passô lá, acalquem aqui na Galeria dos Vídeos do Parente da Refóias ó na Galeria do Magusto de Marmelete.

Os videos tamém 'tão logo aí prebaxinho. É só acalcar im cimba deles.

E passem munto bem.













21 de outubro de 2010

A Descasca de Marmelete 2010

Descasca de Marmelete 2010
Assim é qu' ê cá gosto de ver as maçarocas. Drento duma casnastra de vime, nã é cá im celhas de plástico...


- Isto agora tem sido aí uma belharcada de festas qu' até!...

- Ê cá vô-me a quái todas... Mái, d'zer a verdade, já é uns trabalhos uma pessoa dar conta de tanta coisa...

- Tamém ê cá, amigo Chico. Olhe, inda ontordia, más um nada, tinha-me desquecido duma inaguração dumas coisas que dôs estrangêros puseram lá na Galeria de Santo Antóino. Se nã é a minha Maria dar por ela, nã tinha lá ido. Ah isso nã tinha...

- Pôs com-migo dé-se o caso que tamém nã f'quí a juar da descasca de Marmelete que nã calhô.

- Mái semp'e foi lá, qu' ê bem no vi todo agarrado à maçaroca...

- Já tu 'tás com as tuas... Descasquí até uma bela manchinha delas, se queres que te diga. É um serviço que semp'e gostí de fazer.

Descasca de Marmelete 2010
Inda assim era um belo monte de maçarocas. Mái a famila descamisô aquilo tudo im menes de nada...


- Pôs, mecêa jogô-se a uma preçanada delas... Ê já disse que vi. Era umas atrás das ôtras...

- Hoje, já vejo que nã se pode falar contigo, Chico. 'Tás p' ô gozo e inda t' adiantas pr' aí. Que tu, q'ondo calha, nã és lá munto certo da bola...

Esta conversa passava-se na rua da minha casa, ê cá assantado no pial e o Chico Bôicinhas, d'em pé, qu' ele é moço mái novo e inda s' aguenta bem nas canôiras.

Aí, a minha Maria, qu' andava p' ali a besoirar na cozinha, ôviu conversar, mái c'm' nã conhecesse a visita p'la fala, soô lá de drento:

- 'Tás p' aí a ramocar sózinho ó quem?...

Qe era p'a ê cá publicar quem é p' ali 'tava com-migo.

- Atã nã vês qu' é o Chico Bôicinhas que 'tá aqui com-migo?!... Anda cá aqui mái p' ô pé da gente, Chico!... E assanta-ta aqui no pial. Que precisão é que tens de 'tar aí d' em pé?... Mái, c'm' ê cá ia d'zendo...

Descasca de Marmelete 2010
D'ora im q'onto, par'cia uma ó ôtra maçaroca piquenalha. Mái tinham munta charrafa...


- O que tu ias d'zendo é que se nã fosse ê cá a fazer-te alembrar, tinha-se más era fêto cruzes à descasca de Marmelete, que nã se tinha lá posto os pés. Essa é qu' é essa!...

- Nã posso d'zer o contráiro, nã senhora. E méme assim, chigamos lá já a famila 'tava toda jogada a desencamisar maçarocas, qu' aquilo, p'ro jêto, pegaram ô serviço à hora im ponto.

- Mái só tinham desencamisado p' aí umas duas ó três canastras de milho. Tamém nã foi assim um atraso tã grande c'mo isso...

- E méme que fosse... Atã, com a chusma de famila que p'a lá 'tava que más um que menes um... Ele, méme assim, aquilo despachô-se im que 'stantes...

- Atã e maçarocas de milho incarnado? Par'ceu p'r lá alguma?

- Nã sabes?!... Atã des que foste lá e viste a gente e tudo...

- Pôs fui, mái nã sê se vomecêas deram com alguma maçaroca dessas...

Descasca de Marmelete 2010
A Senhora Presidenta tem semp'e um convindado p'a dar à famila que vai lá...


- Eh'q!... Isso é coisa que já nã há... O milho, agora, é híbr'do. Tomara ê cá incontrar uma...

- Jogava-se logo a abraçar aquelas moças todas...

- Ora nãinques!...

Más a minha Maria 'tava d' ôvido bem à escuta e saltô logo:

- Nã querias mái nada, não?!... Vê lá se te pões no tê lugar... Ó queres partir a pêa, agora já com essa idade que tens?...

- Atã nã vês qu' isto é só a gente a charolar, m'lher?... Ali o Chico é que nã l'e perdoava, tenho a firme certeza. Agora ê cá?!...

- Ê cá?!... Ó ti Refóias, dêxe-se disso... Tomara ê cá que nã faça vento...

- Mái, escuta lá. Atã e adond' é que foram fazer o almêxar? Insacaram as maçarocas todas e puseram-nas na camineta da Junta...

Descasca de Marmelete 2010
... e, im cima dum bolinho, calha semp'e bem um calcesinho dela. E era méme da boa...


- Olhe, isso nã sê. Calhando até que nã t'veram preciso de fazer almêxar. As maçarocas já haveram de ter panhado sol àvonde. Bem secas 'tavam elas. P'a nã d'zer piladas...

- Mái méme que nã nas ponham ô sol, hã-de fazer a dessabuga... Ó tamém não?...

- Dessabuga?!... Isso!... Com as máquinas qu' eles agora têm p'a tudo?!... Aquilo metem as maçarocas lá numa debulhadora e pronto, já está... Ó atão, ratraçam-nas assim e dã-as ô gado.

- Más olha, nã te vás sem reposta qu' ê cá inda gostava de ver assim um almêxar de milho daqueles grandes, tudo estendido ali ô sol e, despôs, em ele 'tando bem seco, fazer uma dessabuga c'm' à gente fazia nôtres tempos.

- Levar ali um belo pôco com um sabugo a esfregar na maçaroca até os bagulhos de muilho saltarem todos p'a drento duma cêra ó duma alcofa...

- Podes gozar à vontade, mái que era ad'vertido, lá isso era... Que tu já pôco conheceste disso ó nada. És moço já munto mái novo...

 Descasca de Marmelete 2010
Inda a descasca ia a mêo já o chão 'tava tapado de folhêrascas. Há quem l'e chame fatana...


- Ai nã, que não conheci!... Leví pôcas nôtes na casa do mê pai a fazer esse serviço... Inda bem não, até me fazia doer os pulsos.

- Inda bem. Assim sabes dar o valor... E inda havia ôtro serviço que se tinha que fazer. Mái no trigo que no milho...

- O quem? Só moê-lo p'a fazer farinha p' às papas. Ó retraço p' ôs pintos...

- Atã nã s' aventujava tamém?!... Sendo munto, era com uma pá na êra; sendo pôco, com duas alcofas, uma no chão õtra ô ombro a despejar, num sito adonde corresse uma arajazinha, lá iam as impurezas todas p'los ares...

E hoje fica-se p'r 'qui, mês belos amigos.

Querendem ver videos e retratos do que se passô lá, acalquem aqui na Galeria dos Vídeos do Parente da Refóias ó na Galeria da Descasca de Marmelete.

Os videos tamém 'tão logo aí prebaxinho. É só acalcar im cimba deles.

E até qu'a gente se veja.











7 de outubro de 2010

O Banho do Vinte Nove 2010

Banho do Vinte Nove - 2010
No Banho do Vinte Nove, pr'mêro, rapimpamos-se com o decomerzinho qu' a gente leva...

Este ano ninguém teve desculpa p'a nã ir ô Banho do Vinte Nove. Carruaja havia com fartura qu' a Junta e a Cam'bra trataram disso c'm' fazeram ôs ôtros anos. O tempo 'tava do melhor, amoroso qu' até dava gosto, que nem uma arajazinha se sintia. E, méme que muntos digam qu' isto 'tá mau, qu' a coisa 'tá ruim, eles inda vão p' aí pagando as reformazinhas à famila... Que jêto a gente nã s' ir ad'vertir?!...

Foi o qu' ê cá fiz más a minha Maria e uns tantos amigos. E nã dí o tempo p'r mal impregue. Nem ê cá, nem eles. Eles, digo ê cá, que a maior parte era elas. E elas, c'm' mecêas sabem muntíssemo de bem, quái sempre, inda são mái danadas p'à galhofa do qu' ôs homens. E p' ôs que nã querem crer, olhem bem p'ôs retratos qu' ê cá tirí e p' ôs filmes qu' a minha mánica tamém fez que logo vêem s' a r'zão 'tá do mê lado ó se nã 'tá.

D'zer a verdade, já ia p'a uns dôs anos qu' ê cá nã punha lá os pés. Nã que nã gostasse d' ir sempre, mái atão as coisas nem sempre calham a nosso favor... Olhem, o ano passado, nã sê se fui ê cá se foi a minha Maria - ó saria-se os dôs... - 'tava-se com uma catarrêra que nem pensar em sair do monte. De manêras que f'camos p'r 'qui. E há dôs anos, se nã 'tô atribuído, o tempo béque-me 'tava chuvoso que nã deu p'a se fazer nada de jêto.

Banho do Vinte Nove - 2010
... muntas das vezes, méme p' à famila da alta, até umas papas mirôilas dã jêto. E sâ gostosas, nã cudem...

Más olhem, desta vez, as coisas correram-me tã bem que nem tampôco tive precisão da via da Câm'bra. Nas béspras, ó p'a melhor d'zer, quái uma semana entes, tive logo aqui a oferta dum amigo que me levava a mim e á minha Maria e mái os mês compadres. Foi o parente Cosme da Quinta.

'Tá bem qu' a via dele - uma camineta de caxa aberta e já um coisinho usada, ora usada, 'tá quái fêta num caneco - nã é lá grande coisa p'a um serviço destes, mái c'm' àquilo era p'a s' ir de nôte, tapados com o encerado qu' ele tem lá, e a Guarda, a essas horas, calhando, eram capazes de 'tar a comer qualquer coisinha e nã andarem aí na estrada a charingar um e ôtro, pegamos na gente e foi-se todos. E inda mái uma pagela deles...

Iam tantos c'm' dez amalhòfados debaxo desse tal encerado. Tirando o chòfer, o compad'e Jôquim do Barranco e a c'mad'e C'stóida, qu' esses, foram na cabine más a minha Maria. Era ê cá, o Adelino da Desmoitada, um gozão do pior, o Arraúl Vàlise, o ti Luís Agúida que tem um mata-velhos mái nã anda de nôte que tem medo, o Martinho do Almarjão, alomeado p'r 'Pata-Rasa', o Tóino Luzicuco, semp'e de cigarro na boca, o parente Zé Caçapo, 'Verruma' l'e chamam, semp'e a sovinar, e fico-me p'r 'qui qu' os ôtros iam todos acuados ô canto do taipal e já nem m' alembra bem quem eles era...

Banho do Vinte Nove - 2010
... bebe-se-l'e, tamém, um calcesinho dela. Da boa, 'tá bom de ver...

Nôtres tempos, nã era nada disto. O mái que se podia arrenjar era um carro de besta com uns sês ó sete lugares, nã contando com o carrêro. Quem nã t'vesse carro de besta ó d'nhêro p' ô alugar, qu' era o que se dava com quái todos, ia a pé ó, calhando a terem um burro na arramada, amontavam-se nele, à vez, e passadas umas quatro ó cinco horas, chigavam o sê destino deles, na Praia do Vau.

Mái nã cudem, lá por isso, a galhofa nã f'cava nada atrás do qu' a famila faz hoje em dia... Mái p'ra más do que p'ra menes. Nã vêem, é qu' ir désna de Monchique - levem bem repáiro que d'zer Monchique é o mémo que falar na Serra toda. É o concelho duma ponta à ôtra. - até à Praia do Vau de carro de besta ó a pé inda levava umas belas horas e a famila tinha qu' ir logo adiantando algum serviço.

De manêras que, ia-se andando e c'mendo. Uns p'xinhos da horta, uns coisinhos de chôriça, uma f'lhòzinha, umas coisinhas assim... E p'a impurrar isso p'as goélas abaxo e nã imbassar, o qu' é qu' uma pessoa podia fazer?... 'Tá claro, bebia-l'e uns porrêtes... Ora aquilo dava cá uma influêinça!... Nem o caminho custava a andar...

Banho do Vinte Nove 2010
... charola-se e balha-se um belo pôcachinho p'a desmoer a pelharcada...

Esta conversa fez-me vir à idéa o que se deu desta vez. O Tóino Luzicuco, semp'e com a mania do tabaco, que nã pode passar, 'tava-se a gente todos munto bem sa senhora boa vida amalhòfados debaxo do incerado, puxa da sua onça 'Àguia' dele e do sê livro de papel béque-me da méma marca, tira uma mortalha, despeja-l'e um coisinho de tabaco p'a drento e vá d' inrolar. Pensí cá pra mim:

- Nã me digam qu'este saganheta vai-se pôr a fumar aqui mémo num sito destes...

Inrolô, inrolô... passô-l'e cuspinho com a língua na ponta da mortalha, deslizô-l'e o dedo duma ponta à ôtra p' àquilo colar, deu umas batidinhas com a ponta do cigarro na unha do dedo grande - há quem l'e chame o mata-piolhos... - e pôse-o na boca. Pensí:

- Ehq, aquilo, calhando, é só p'a ele matar o viço e nã no acende, se nã a gente cuda de morrer aqui com falta d' ar e desata tudo a tossir.

Qual o quem?!... Tã penas olho ôtra vez p'ra ele, já o marafado tinha tirado uma caxa de forfes da alsebêra e toca de tirar um forfe p' ô acender. Às escuras, o Tóino nã fechô bem a caxa. Ora, nesse mê tempo, o parente Cosme teve que fazer uma travaja a fundo - só mái tarde é que sube que se l' atravessô um bicho na frente da camineta. O Tóino inda riscô o forfe, sa senhora, e acendeu-o, mái atão, com o balanço, os ôtros des'parceram todos da caxa... Desata tudo numa risada:

Banho do Vinte Nove 2010
... e só despôs é que s' afituramos a ir p'a drento d' água...

- Ai Tóino que lá se foram as tuas acendalhas todas!... E, calhando, o cigarrinho tamém...

- Nã queria mái nada!... O cigarrinho 'tá aqui na boca e este forfe inda 'tá a arder. Dêxa-me lá acender o cigarro entes qu' ele s' apague...

- Olha lá nã sabes que nã é atorizado fumar im sitos fechados?!... Nã vês qu' isto aqui é c'm' se fosse lá na venda do Alferce... Eles lá dêxam-te fumar?...

- Nã vejo aqui nenhum papel na parede a d'zer o contráiro. De manêras que nã seponha com coisas. Más a más qu' o sito é bem arejado...

E pôs-se a ver se dava panhado os forfes que tinham caído. Mái atão, com o vento que antrava p'a drento do encerado com o andar da camineta, adonde é qu' eles já 'tavam... Nem um...

- Bem fêta, qu' é p' à ôtra vez respêtares. E, agora, era bem fêto qu' o vento tamém te levasse o cigarro da boca.

E dí uma piscadela d' olho ô ti Zé Caçapo. Ele, p'r alguma r'zão l'e chamam o 'Verruma', intendeu logo, vai assim p' trás do Tóino Luzicuco, c'm' quem nã quer a coisa, dá-l'e um toque de lado com uma mão, ele volta a cara, ô méme tempo, dá-l'e ôtro toque no cigarro com a ôtra mão, lá vai ele p'ros ares...

Otra risada im forte... Más aí, o Tóino f'cô um coisinho sintido e desatô a d'zer alarvidades. Se nã é o ti Zé Caçapo ser um homem duma certa idade, nã sê nã sê... Inda vi jêtos do Tóino se jogar a ele. Mái a coisa lá atamancô e, dali a um nadinha, 'tava-se a chigar à Praia do Vau.

 Banho do Vinte Nove - 2010
... ô fim, volta-se p'ra casa, todos sastefêtos, com a trugia toda às costas...

Do que se passô lá méme na arêa da praia já mecêas hã-de saber. Foi tudo munto ad'vertido, a famila incheu tudo o bandulho até mái não, de coisas p'a bober só f'cô lá a água do mar. Quái todos balharam, cantaram e uns tantos que t'veram mái foiteza sempre se jogaram à água p'a se lavajarem e p' à SIC filmar.

Só o que l'es sê d'zer é que inda pus os caguetes tamém drento d' água e, d'zer a verdade, nã na achí munto fria, mái c'm' à minha Maria se tinha desquecido da toalha im casa e as cirôilas qu' ê cá levava eram novas nã me dava jêto molhá-las logo, só cheguí com a água p'ros artelhos. Mái hôve menino que antrô lá p'a drento e quái que já nem queria sair. Ôtros, atão, ensiavam-se qu' ê bem nos ôvia. E, no mêo daquilo tudo, inda béque-me hôve lá um que vinha a arrabolar inrolado numa onda...

Querendem ver videos e retratos do que se passô lá, acalquem aqui na Galeria de Vídeos do Parente da Refóias, na Galeria do Banho do Vinte Nove, e na Galeria do Picasa.

Os videos tamém 'tão logo aí prebaxinho. É só acalcar im cimba deles.

Dés l'e dê saúde.
























18 de setembro de 2010

Tocadores de Fole e Artechique 2010

XXIII Encontro de Acordeonistas - Monchique, 5-09-2010
Tal acham esta concertina? E inda toca melhor que muntos foles modernos...

- Se nã vieste à festa dos tocadores de fole, nã sabes q'onto perdeste!... E à Fêra do Artesanato tamém. Más ê cá, d'zer a verdade, gosto mái dos toques de fole que do resto...

- Ai nã fui... A si é qu' ê cá nã no vi lá. Fique sabendo que nã perdi nem uma moda. Fui bem cedinho, assantí-me numa cadêra e vi aquilo tudo do prencipo ô fim.

- Ai 't'veste assantado... Qualquer um nã tem essa sorte. 'Tá bom de ver que só panha lugares desses quem tenha pazes com a famila lá da Junta... Nã é verdade, Refóias?... - E piscô-me o olho, a ver s' ê cá l'e dava os améns.

Isto era a conversa qu' o Martinho do Almarjão 'tava a ter com o Tóino Luzicuco, uma tarde destas, ali memo no Largo dos Chorõs, q'ondo ê cá lá passí caminho além da loja do chinês a ver se dava lá com uma farramenta qu' ê cá tinha preciso p'a um serviço que já tenho aqui há que tempos p'a fazer.

O qu' ê tinha fêto bem era nã ter levado repáiro neles, fazer de conta que nã nos tinha visto e ir fazer o mê governo, mái as coisas são c'm' são e, atão, lá l'es dí uma vaiazinha, méme me parecendo qu' eles 'tavam os dôs um coisinho escorvados. E 'tavam. Mòrmente o Tóino Luzicuco que abalô do Alferce logo de manhão e, até àquela hora, inda nã tinha comido coisíssema nenhuma. Só bobido.

XXIII Encontro de Acordeonistas - Monchique, 5-09-2010
O amigo Adelino 'Cruzinha' toca cá umas modas qu' até dá gosto...

- Atã, digam-me lá uma coisa: no fim de resto foram os dôs ver os homens tocar os foles ali no Encontro de Acordeonistas ó só foi um ó nã foi más é nenhum?

- Foi-se os dôs, sim, Refóias. Ê cá é que 'tava a mangar aqui com o Tóino, a ver s' ele tinha dado por mim lá, mái vi logo qu' ele 'tava tã emprensado lá na tal cadêra da Junta que nem olhava fosse p'a donde fosse a nã ser p' ôs tocadores...

- Atão?... Queria qu' ê cá andasse a ver s' o lombrigava lá no mêo daquela famila toda?... Era o que faltava!... Ê fui lá foi p'a ver eles tocarem aquelas lidessíssemas modas nos foles...

- E nem repairaste im mim que 'tava ali incostado à parede p'a me furtar à soalhêra. Tu c'm' 'tavas ali à sombra das tilêras...

- T'vesse ido mái cedo que panhava tamém um lugar c'm' o meu. E nã era preciso ter pazes com a famila da Junta qu' ê cá tamém nã tenho...

D'zia o Tóino a fazer-se munto sentido ô mémo tempo que largava a mão do tróço da tilêra adonde 'tava incostado e dava um gangueão tã grande ó tã pequeno que quái que dava uma marrada no Martinho do Almarjão.

XXIII Encontro de Acordeonistas - Monchique, 5-09-2010
Ele há p'r'í uns mecinhos nôvos que tamém já tocam qualquer coisinha...


- Quem nã tem sê eu. Agora tu, nã sê nã sê... Mái chega-te p'ra lá nã me faças pr' aqui bater a apèraja. Nã vês que quái que me ias pisando a bota e ê tenho aqui um calo que nã pode ser trilhado...

Respondeu o Martinho já um coisinho infèzado, béque-me quái com o sãingue a l'e chigar às ventas. Atalhí logo:

- Nã te marafes, Martinho. O homem nã fez isso d' aprepósito... Mái já que vieram os dôs ver os tocadores, que tal acharam?... Ê cá só vi pr' aí uma àmetade. Tive um impendiclo...

- Sê cá se vieste, Refóias. Atã ê cá nã te cheguí a ver p'r'í... E, despôs das modas, inda m' assomí ali às barrecas do artesanato e tudo.

- Tanto que vinhe qu' até tenho lá im casa uma mêa-dúiza de retratos p'a apresentar, mémo ruins... Nã vês, Martinho, aquilo 'tava uma soàlhêra qu' até quem-mava, incostí-me ali a um cantinho à sombra com a minha Maria e dali nã saí senã q'ondo tive precisão disso.

- Atã e nã amostras isso à gente?...

- Olha, pede aí a quem quereres que t' as amostre qu' elas vão ser todas postas na internet. Aquilo dos computadores qu' a gente dá visto lá tudo o que quer e o que nã quer... 'Tá num sito alomeado p'r 'Vídeos do Refóias' e 'Galeria do XXIII Encontro de Acordeonistas'.

- Ó amigo Refóias, atã e ê cá tamém posso ver isso ó quem?...

XVI Artechique - Feira/Mostra de Artesanato de Monchique
Com trapos velhos tamém há quem faça coisas bonitas. C'm' estas da parenta Marí Júlia...

- Olha, Tóino, em te passando essa pelhega tamém dás visto. Agora já, calhando, é melhor não. Sabes que jêto? É que, da manêra c'm' tu 'tás, o mái certo é veres tudo ôs pares e f'cares inda más almareado...

- Almareado, ê cá?!... Olhe p'ra isto!...

E, béque-me, fez a amenção d' alevantar assim o pé, c'm' quem qu'sesse fazer um quatro p'a amostrar que nã 'tava escarado. E o qu' é que se deu?... Más um lóre p' ô lado do Martinho que, se nã é ele l'e jogar a mão à manga da jaqueta, tinha-se espatarrado no mêo do chão...

- Atã e com respêto ô artesanato - que dos tocadores já vi que gostaram os dôs munto, méme sem me contarem - tamém foi alguma coisa de jêto?

- Ora se foi... Tinha ali uma barreca adonde vendiam umas emperiais, 'tava méme fresquinha a marafada da cerveja... Comprí uma chôricinha p'a acompanhar, nã l'e digo nada...

- Ê vi logo qu' era pr' aí que tu imbicavas... P'ô lado lá daquelas coisas tã bem fêtas qu' a famila tinha lá p' à gente bispar, isso, 'tá bom de ver, nã 'par'ceste...

- Atã c'm' é qu' ê cá tinha tempo p'a tudo?... Se 'tava numa banda nã 'tava nôtra. Só se 'tá adonde se 'parêce...

Salta logo o Martinho:

 XVI Artechique - Feira/Mostra de Artesanato de Monchique
O amigo Zé Ilídio tamém impalhô uns garrafanitos aqui na Artechique...

- Nã senhora, ê cá tamém vi lá isso... Até 'tava lá uma parenta tua com umas coisas qu' ela faz com trapos. Umas bolsas, umas toalhas, aventás e tal e tal... E, olha, p'a te falar verdade, aquilo até que 'tava muntíssemo de bem fêto. Nã sê c'm' é qu' ela arrenja pacência p'a tanto...

- Ê cá tamém vi...

- E nã era só ela. 'Tavam lá mái umas duas ó três com o mesmo. Tudo munto jêtoso. E nã era só isso...

- Pôs não...

- Atã se sabes, diz lá tu, Tóino... O qu' é que 'tava lá más?...

- Ora, 'tavam ôtras coisas...

- Ôtras coisas, ôtras coisas... Tu nã passaste da barreca da cerveja p' à banda de lá, c'm' é que tu há-des saber...

- ...

- Viste a verga? As cadêras de tisoira? E p'r 'í fora?...

- Atã nã havera de ver?!... Vi tudo, sa senhora...

- Inda agora d'zeste uma coisa, agora dizes ôtra. Vai más é indròminar ôtro...

 XXIII Encontro de Acordeonistas - Monchique, 5-09-2010
A Senhora Presidenta da Junta é que foi dar as lembranças ôs tocadores de fole...

E a conversa inda 'tava p'a durar s' ê cá nã t'vesse mái nada p'a fazer. Mái c'mo nã 'tava p'a perder o mê governo, despedi-me e fui andando. Tamém, nã tenho precisão nenhuma de falar mái nada da Artechique que mecêas foram lá todos ver aquilo e, atão, é melhor nã nos 'tar a impertenecer. Mái que aquilo 'tava do melhor, 'tava. Nã l'es parêce?

Agora, querendem, podem ver alguns tocadores de fole e más alguns retratos da Artechique. É só acalcarem aqui na Galeria dos Vídeos do Refóias e na Galeria do XXIII Encontro de Acordeonistas.

Ó atão, vejam logo aí prebaxinho e oiçam umas modinhas à manêra.

Fiquem-se com Dés.













6 de setembro de 2010

Fui à Fatacil mái nã paguí bilhete

José Inácio Rosa, artesão de Monchique
O amigo Zé Ilídio sabe fazer verga c'm' pôcos...

Isto, agora, no verão há p'r'í tanta festa ó tã pôca qu' uma pessoa nã sabe p'a que lado é que s' há-de virar. Se vai a uma banda nã vai a ôtra, se vai a esta nã vai àquela. E isto p'a já nã falar nôtros casos c'm' quem tenha água de partilhas num dia desses e nã na possa dêxar de regar...

Vem esta conversa premode um passêo qu' ê cá e más a minha Maria se foi dar na ôtra semana a um lugar que já nã é pr'mêra vez que lá se vai: à Fatacil. Nã se tinha fêto conta d' ir a tal sito este verão, mái ele hôve uma amiga de minha Maria lá de baxo de Vila Nova que arrenjô uns bilhêtes p' à gente se poder antrar sem pagar nada e atão semp'e se resolvemos a ir.

Sim, que nã sê se mecêas sabem mái aquilo p'a antrar lá, uns pagam, ôtros não. P'r menos é o que chigô ôs mês ôvidos. Um f'lano, tendo um amigo - um comerciante ó artesão ó coisa assim - que l' arrenje uns convintes, antra de graça. Nã tendo, paga cinco eros...

Produtos regionais de Monchique
Quem qu'sesse, provava um coisinho de chouriça, morcela de farinha ó mólhe do amigo Vangelista...

Mái o caso é qu' a gente inverdamosprêabaxo e par'cemos p'r lá. E o más ingraçado, sem ter graça nenhuma, foi que im vez de se antrar lá p'r a porta da frente, aquela grande p'r donde antra quái toda a famila, foi-se imbirrar com uma mái pequena que fica lá p' trás, inda p'a lá das arramadas daqueles bichos qu' eles lá têm. Mái o homenzinho dêxô a gente antrar e a gente antrô...

Atã e nã é que tã penas chigamos ô pé dos cavalos damos logo de frente com o parente Zé "Caçapo" - o "Verruma" - todo munto intretido na conversa com o ti Vergil Patinha, o Tóino "Luzicuco" e o Martinho do Almarjão - 'Pata-Rasa' l'e chamam (o homem tem os pés chatos...). A conversa era béque-me a respêto de cavalos c'm' s' o homem alguma vez t'vesse sido almocreve e sabesse alguma coisa daquilo?!... Pôs s' ele nunca possuiu tã pôco um macho... que o vi foi sempre com burros lazêrôsos e bem ruinzalhos...

- Olha o parente Zé!... Atã c'm' é que vai isso, hom?... 'Tavam à espera da gente? Se fosse combinado, calhando, nã se incrontávamos assim...

E vá uma tanganhada... Voltí-mr p' ôs ôt'os três e falí-l'es tamém:

- Atã e mecêas c'm' é que 'tão? Tamém vieram ver a fêra?...

- Ehq, isto é todos anos a méma coisa... Mái uma pessoa tamém s' aborrêce de 'tar sempre lá ô monte...

- Nã me diga, ti Vergil, que mecêa tamém vêo apresentar aqui o sê burro, o "Carôcho"?... Vejo àlém um a comer palha naquela masdoira...

Salta logo o parente 'Verruma', semp'e muntogozão:

- Qual, aquele que 'tá além na arramada ó algum dos que 'tão ali assantados naquelas mesas da esplanada?

Pavilhão de Monchique na Fatacil 2010
A parenta Mari' Nunes a trabalhar no seu tear dela...


- Lá 'tá mecêa semp'e com as suas. Ele é bem verdade que há p'r 'í muntos d' orelha curta... Mostre lá as suas!...

- Pôs as minhas sã curtas e palha nã como... Veja lá pr' aí bem isso... Ó, atão, tarê qu' o levar além um coisinho más adiante a ver um vivente que 'tá lá dêtado...

- Algum bezerralho? Béque-me vejo àlém umas vacas...

- Quales vacas nem quales bezerros!... Venha cá com-migo se quer ver uma coisa jêtosa...

- Com esse jêto, hum... Boa nã vai sair daí... Ó cuda qu' ê cá nã no conheço já munto bem? Mái nã s' adiante munto, olhe qu' ê cá respondo-l'e ô consoante...

- Nã tenha medo ti Refóias, aquilo nã é nada de mal... Venha com a gente e aprecêe. - Diz logo o ti Vergil Patinha que já sabia do que se tratava.

E lá fomos caminho d' adonde 'tava o gado.

Nã era munta coisa... 'tava o tal burro, uma porcalha com bacorinhos, umas bezerras, umas cabras e o más era ovelhas. Ô chigar à arramada das cabras, daquelas algarvias - um gado bonito, nã se pode d'zer o contráiro - já ele se ria voltado p' ô Tóino "Luzicuco"...

Trabalhos da D. Maria Nunes feitos com o seu tear tradicional
Com o tear e uns trapinhos a parenta Mari' Nunes faz estas coisas todas...

- Tóino, tal achas a armação desse b'chinho? F'cava bem aí a muntos... Até inrolam!... - E vá de dar carcachadas, o marafado...

Más o pior é que, logo da bandinha de lá, 'tavam umas ovelhas e um carnêro. E, mês belos amigos, aquilo tinha que se d'zesse... O bicho já era velho e já se sabe qu' aquela coisa qu' eles têm na cabeça nunca pára de crecer. Ora... vejam bem aí no retrato e logo me dizem que tal...

Volta-se o mariola p'ra mim e, sempre munto cão, prècura-me:
- Ti Refóias, qual é o sê numbre de chapéu? É o qurenta e sês ó o qurenta e oito?

- O qu' é que mecêa tem com isso? Quer-me comprar algum?... Ê cá, q'ondo tenho preciso vô-me à Chapelaria Ideal, àlém im Vila Nova. Nôtres tempos, inda havia adonde comprar tal coisa lá im Monchique. À do Sr. Antóino Albano ó à do parente João Chula, que Dés os tenha, quái sempre tinham. Más agora já dô notiça disso...

Disse ê cá a ver se desviava a conversa qu' ê vi logo que dali nã vinha boa coisa... Qu' o saganheta 'tava era a querer antrar com-migo premode o gradessíss'm' ô chapéu qu' o carnêro tinha... Más ele voltô ô assunto:

- Nem que fosse o sessenta aquele ali nã l'e servia... Nã sê adonde é qu' o b'chalho arrenjô uma coisa tã bonita. Nã vê? Já dá umas três voltas... E já l'e cortaram as pontas, senão...

Exemplar de carneiro na Fatacil 2010
O bicho já quái que nã podia com o chapéu, tinha que arrimar o focinho no chão...

- Pôs nã me servia, nã senhora... Agora a si, nã sê, nã sê... ponha-se lá assim mái de lado p'a ê cá l'e tirar as medidas...

- Ê cá nã tenho precisão que já 'tô governado!... Agora p'ra si, até era pessoa p'a l'o comprar de boa mente e dar-l'o dado...

- M't'ôbrigado m't'agradecido, mái fique lá vomecêa com o presente se l'e faz jêto. Más a más com o peso qu' aquilo tem só p'a homens rijos c'm' à si, ti Zé... Nã vê qu' o bicho já custa a suster a cabeça no ar e só 'tá bem é com os quêxos arrimados no chão?...

- Bom, bom... Vamos más é dar mái uma voltinha qu' isto aqui já nã enteressa... O ti Refóias, querendo, logo vem comprar o chapéu mái tarde...

- Alguma vez?!... Ele fica é já afiançado p'ra si!...

E abalamos caminho da barreca, ó, c'm' dizem pr' aí, do pavilhão de Monchique. E im boa hora...

Olhem, pr'mêro, 'tava logo lá uma menina da Cam'bra a dar uns b'lhetes duma rifa p'a s' ir passar uns dias nas Caldas de Monchique, naquele hotel novo qu' eles fazeram lá. Ê cá e a minha Maria demos logo o nome. A mim nã me sai nada, tenho a firme certeza, agora à minha Maria é certo e sabido que vai ter pré'mo. Em ela jogando nas rifas, sai-l'e sempre... De manêras que, prestes, 'tô fazendo conta d' ir lá dromir uma noite ó duas.

Vista interior da Fatacil 2010
Havia p'r lá umas moças dêtadas na erva. E gordinhas qu' elas eram...

Despôs, arrodeamos p' à banda de lá, demos com um prato chêo de rodelas de chôriça, morcela de farinha e mólhe. Ora, nã t'vemos ôtro reméd'o senã provar... Eram do amigo Vangelista ali do Pé da Cruz. E inda provamos tamém um calcesinho dela... Era da boa.

Voltamos-se pr' ô ôtro lado, 'tava o amigo Zé Ilídio a fazer verga. D'zer a verdade, ele chama-se José Inácio Rosa, más é alomeado p'r Zé Ilídio em mimóira do pai que Dés tem, que tamém era um amigo do melhor. Diz logo ele p'ra mim:

- Tire retratos à vontade, ti Refóias, tire os que quêra!...

E pegô logo na garrafinha e no copo p'a dar uns porretes à gente. Da dele, cudo ê cá. Era c'm' mel. Até estralava às goélas abaxo...

Logo da bandinha de lá, 'tava o tear da parenta Mari' Nunes. Já toda a gente conhêce. Nem tenho míngua de falar nisso. Nã há ôtro c'm' àquele e as coisas qu' ela faz 'tão bem à vista.

Inda corremos o resto, más aí tive que me aprecatar qu' a minha Maria põe-se a ôvir aqueles rèclames tôdos, os marafados chama-na logo ali p' à frente, nã sê se l'e fazem alguma benzedura s' o qu' é que é, indròminam-na duma tal manêra qu' ela, im menes de nada, quer comprar aquilo tudo...

O ano passado, comprô p'a lá uma bassôira ó lá o qu' aquilo era, nã prestava p'a coisíssema nenhuma que já a jogô p' ô monturo, e custô um poder de dinhêro. De modes que, este ano, jogô-se foi a comprar barros. Coisas des que duma fábrica que fechô lá p'ra cima e vendem tudo no barato. Mintiredo...

Querendem ver más alguns retratos da Fatacil deste ano, acalquem aqui na Galeria da Fatacil más é tudo coisa pôca.

E até qu' a gente se veja.

28 de agosto de 2010

A Galeria de Santo António

Galeria de Santo António - Monchique
Logo na inaguração da exposição, a Galeria de Santo Antóino tinha munta freguesia...

Ontordia, d'zeram-me que des qu' ia haver p' aí uma exposição na Galeria de Santo Antóino. Béque-me de quadros e estátuas. Mecêas, calhando, nã vão acraditar, más olhem qu' até arrecebi um convinte. Mandaram-mo por esta coisa da internet...

De manêras que andí uns dias a ramoer naquilo, vô nã vô, sem saber o qu' havera de fazer. Mái, nisto, dé-me assim um derrepente, pensí:

- Atã que jêto nã?!... Vô-me más é falar com a minha Maria, a ver o qual é a idéa dela e nã perco aquilo...

E assim fiz.

E o qu' é que se resultô dali? 'Tá bom de ver qu' ela dé logo os àmens todos. Parvo era ê cá se cudasse o contráiro. Atã s' a m'lher 'tá semp'e fêtinha e de'josa p'a ir aqui e ali, seja ele p'a donde for...

Galeria de Santo António - Monchique
O Senhor Presidente da Cam'bra tamém lá par'ceu. E devassô tudo de fio a pavio...

- Já qu' ele é isso, im que dia é qu' a gente vai lá?

Prècurí-l'e ê cá p'a poder terminar a minha vida e fazer os mês preparos a tempo e horas.

- Ó homem, isso é prècura que se faça?!... Atão, se te convindaram p' à inaguração... A inaguração nã usa a ser logo no pr'mêro dia?... E que nã fosse... Candêa que vai à frente alumia duas vezes... Nã há nada c'm' à gente par'cer lá tã penas se possa. Nã vã eles vender p'a lá os quadros todos e a gente ficar a fazer-l'e cruzes...

- Ah, pôs... Já nã m' alembrava. Foi p' à inaguração, foi. O convinte era p' à inaguração. Era isso mémo...

- E, más a más, qu' ali a comad'e C'stóida já me contô que l'e d'zeram que, nessa dita nôte da inaguração, é certo e sabido que vai haver lá comes e bebes e tudo!...

- O quem?!...

Galeria de Santo António - Monchique
A famila 'tava tudo emprensado a ver coisas tã bonitas...

- Sim!... Des que umas coisinhas p'a dar ô dente e umas bobidas p'a molhar o bico. Há-de ser assim umas provas c'm' à gente, q'ondo calha, usa a fazer.

- Eh'q!... C'm' à gente usa a fazer... Isso, nã tem nada im ser uma coisa assim p'ô fino e ê cá, e tu tamém, nã se tem condiçõs p'a se metermos im coisas dessas...

- Que jêto não?!... Lá cudas qu' os estrangêros são mái descretos do qu' à gente. Sim, qu' aquilo, a maior parte dos que p'r lá parêcem hã-de ser estrangêros...

- Há-des ter r'zão, sim. Nestas coisas, os que parêcem é quái tudo estrangêros. A famila de cá, nã sê o que têm, s' é p'r serem vergonhôsos ó s' o qu' é que é, béque-me nunca parêcem...

- Pôs atão, qu' eles vão que nã vão, a gente vai. Nã te parêce? Isto é só uma conversa. Que tu é que mandas...

- Sim, m'lher... Que jêto nã s' ir?!...

E a coisa f'cô assim terminada.

Galeria de Santo António - Monchique
Quem qu'sesse ver as pinturas, assubia até ôs altos...

Chigados ô dia, inda 'tive vai nã vai p'a dar uma vaiazinha à C'mad'e C'stóida e ô compad'e Jôquim, mái, despôs, pus-me a cismar qu' eles nã tinham sido convindados e des que "a casamento e batizado nã vás sem ser convindado" e, atão, achí melhor f'car calado.

Que, d'zer a verdade, ele, o mê compad'e Jôquim do Barranco, nã é moço munto dado a essas coisas e ê cá já sabia munto bem que m' afiturava era a ele d'zer logo que não e, em ele embrutando com uma coisa, é má de mudar d' idéa. Agora a c'mad'e C'stóida, essa sim, tenho a firme certeza que 'tava-se pelando p'a ir. Mái dêxamos lá isso...

De modes que, à hora marcada ó um coisinho entes, apresentí-me lá com a minha Maria, os dôs bem arrenjadinhos com a rôpinha do Domingo, qu' a coisa nã era p'ra menes. Uma pessoa sabia lá quem é que p'r lá 'tava?...

Olhem, e inda bem. P'mêro, só vimos engleses. A minha Maria des qu' uma que 'tava lá era alemoa, qu' ela sabia que era, e os ôtros c'm' 'tavam a falar com ela, calhando, tamém sariam, más ê cá c'm' intendo tanto duma fala c'm' da ôtra, nã l'es sê d'zer ô certo d' adonde é qu' eles todos eram.

Galeria de Santo António - Monchique
Digam lá se nã é uma coisa im condiçõs...

E, atão, o qu' é qu' a gente fez. Fomos logo caminho do senhor Rolf, qu' é o dono lá da Galeria da Porca Preta, na Cerca da Rita, que ele a gente sabia que fala cá a nossa língua... O homem, munto porrêro, prècurô logo o qu' é que a gente queria p'a bober. Ê cá gosto mái do tinto, a minha Maria gosta mái do branco. Mái p'a nã me tornar munto empertinente, pedi os dôs copinhos mémo do branco...

Nisto, a minha Maria dá-me uma pisadela, d' apreposito, num calo, cudí qu' era premode ê cá 'tar a olhar assim de ravés p'a uma moça estrangêra que 'tava ali toda incalorada, com pôca rôpa im cimba do pelo. Mái nã era. Era o Senhor Presidente da Cam'bra que 'tava a chigar, que tamém ia ver aquilo.

Tã penas o vi, pus-me logo mái d'rêtinho que nem um fuso e arrumí o copalho de vinho, inda a mêo beber, ali no parapêto da janela, qu' o respêtinho é munto bonito... Más o homem, sem ofensa, o Senhor Presidente, nã esperô fogo, assim vem d'rêto a mim e à minha Maria e vá de falar à gente. Ora, foi o qu' a gente quis...

Qu' ê cá já me tinha soado uns zum-zuns qu' ele era uma pessoa munto dada e 'par'cia sempre im toda a banda. Verdade se diga, vê-se mémo qu' ele gosta destas coisas até mái não. E, em vendo lá munta famila, inda mái contente fica. Vê-se logo.

Galeria de Santo António - Monchique
Nos baxos, quem l' apetecesse podia molhar o bico...

O que l'es sê d'zer é qu' o homem, sem ofensa, o Senhor Presidente, devassô aquilo tudo de fio a pavio que nã dêxô nada p'a trás. E ê cá, 'tá bom de ver, aprevêtí logo o atôpo. Tirí retratos todos q'ontos pude com ele lá. Tenha pacência Senhor Presidente e nã leve a mal que vomecêa morcia era que 't'vesse lá um que sabesse tirar retratos c'm' deve de ser. Mái, na falta de melhor, acontente-se méme com estes cá do Parente.

Agora, mês belos amigos, vejam lá se nã vão visitar a Exposição de Pintura e Escultura de Vera Christians e Jean Brown, na Galeria de Santo Antóino... Olhem que aquilo é uma coisa que morêce ser vista e, inda p'r cimba, uma Galeria daquelas tã jêtosa tem que 'tar sempre a foncionar. Mái s' a famila nã vai... 'tá-se méme a ver o qu' é que se ...

Querendem ver más alguns, acalquem aqui na Galeria de Santo António e desculpem lá serem tã pôcachinhos.

Até um dia destes e Dés l'e dê saúde a todos.